Casa de Mateus

Norte | Vila Real

Casa de Mateus

A Casa de Mateus fica a escassos 5 km do centro de Vila Real, no lugar de Mateus. A entidade administradora é a Fundação da Casa de Mateus, instituída em 1970 por D. Francisco de Sousa Botelho de Albuquerque. Os seus estatutos definem como missão a conservação, restauro e melhoramento da Casa, o estudo, catalogação e divulgação do seu Arquivo e ainda a promoção de atividades culturais, científicas e pedagógicas. O acervo arquivístico da Casa de Mateus, alimentado por sucessivas gerações e alianças matrimoniais, remonta ao séc. XVI e foi uma das motivações para a criação da Fundação. Contribui, de um modo singular, para o conhecimento e a compreensão da evolução da paisagem de Mateus.

Os documentos do arquivo remetem-nos aos primeiros moradores da casa em 1577, Cristóvão Álvares e sua mulher Maria Gonçalves. Por morte desta, em 1625, o filho António Álvares Coelho, casado com Helena Álvares Mourão, da Casa da Cumieira sucedeu nos destinos da casa. Instituiu o morgadio de Mateus, com os vínculos de Mateus e da Cumieira, tendo nomeado a filha mais velha, Maria Coelho, e o seu marido, Matias Álvares Mourão de Aguiar, como seus primeiros administradores. Matias Álvares Mourão de Aguiar morreu em 1675. Sobreviveu-lhe sua mulher, sem descendência, que instituiu seu herdeiro o primo Matias Álvares Mourão, conhecido por Morgado da Prata. O seu filho, António José Botelho Mourão, casou com Joana Maria de Sousa Mascarenhas e Queirós, da família dos Marqueses de Minas e portadora de importantes morgadios. Foi no seu tempo que se construiu a Casa de Mateus, atribuída a Nicolau Nasoni (1691-1773), que veio substituir a casa já existente no local desde inícios do século XVII.

Sucederam-lhes os 4ºs Morgados de Mateus, D. Luís António de Sousa Botelho Mourão e D. Leonor Ana Luísa Josefa de Portugal. O morgado passou longos tempos no Brasil como Capitão-General e Governador de São Paulo, enquanto sua mulher administrava a Casa. Data desta época a construção da capela, concluída em 1750, que veio substituir a capela original e tem a autoria do mestre José Álvares do Rego.

Sucedeu-lhes o 5º Morgado de Mateus, D. José Maria do Carmo de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, pessoa ilustrada que seguiu uma carreira militar, interrompida para se dedicar à vida diplomática. A ele se deve a Edição Monumental de “Os Lusíadas”, de Luís de Camões, editada em 1817. Seu filho, D. José Luís de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, que virá a ser o 1º Conde de Vila Real, casou com a irmã do 1º Duque de Palmela, Teresa Frederica de Sousa e Holstein. Cumpriu várias missões no estrangeiro, pouco permanecendo em Mateus. O seu filho, D. Fernando de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, 7º Morgado de Mateus, assumiu ainda novo a administração da Casa. Sucedeu-lhe seu filho D. José Luís de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, que casou com D. Teresa Francisca de Melo Breyner de Sousa Tavares e Moura, 2ª Condessa de Melo. Foram os 8ºs e últimos morgados de Mateus, já que os morgadios foram extintos em 1863. Seu filho, D. Fernando de Sousa Botelho e Melo morreu em 1928, sem descendência e é sobre a sua irmã mais nova, D. Maria Teresa, que vão recair os títulos de 5ª Condessa de Vila Real e 4ª Condessa de Melo. Casou com D. Fernando de Almeida Cardoso de Albuquerque, 2º Conde de Mangualde. O casal levou uma vida atribulada, já que, após a implantação da República, D. Fernando Albuquerque teve um forte envolvimento nas tentativas de restauração da monarquia. Ver: Memórias da Condessa da Mangualde. Incursões Monárquicas 1910-1920. Quetzal Editores. 2ª edição 2002. Neste período, D. Maria Teresa de Sousa Botelho e Melo dedicou-se intensamente ao jardim, ampliando-o e introduzindo um sistema de rega. Seu filho, D. Francisco de Sousa Botelho de Albuquerque (1909-1973), casou com Maria Adelaide de Sousa Canavarro de Mendes Fernandes Costa (1917-1989) e promoveu um imenso trabalho de restauro e melhoramento da casa, preparando-a para o século XX, ao mesmo tempo que introduziu profundas alterações nos jardins na envolvente da casa e na condução agrícola da quinta. Veio a ser o instituidor da Fundação da Casa de Mateus, em 3 de Dezembro de 1970.

O seu filho, Fernando de Sousa Botelho e Albuquerque, já na qualidade de Director-Delegado da Fundação, levou a cabo um vasto conjunto de obras, fazendo da Casa de Mateus um espaço de cultura do Norte de Portugal. Interveio na casa, na capela e na adega, assim como em diversos outros edifícios agrícolas como o lagar de azeite, junto à ribeira das Toirinhas, que transformou em Residência Artística, segundo projeto da arquiteta Teresa Nunes da Ponte, ou o Barrão de cereais, transformado em espaço para a apresentação de exposições, conferências ou espetáculos.

Hoje, acede-se à quinta por um portão, situado na EN 322, que dá acesso a uma curta azinhaga que curva em direção à Casa e atravessa um pequeno bosquete. Daqui, proporciona-se uma vista emblemática da Casa, refletida no enorme espelho de água, tal como a Capela, num plano mais recuado, antecedida de um terreiro com cruzeiro e, mais à esquerda, a Casa da Adega. O enquadramento é feito por bosquetes de carvalhos e castanheiros e pelo conjunto de cedros notáveis, plantados em 1870. Foi o 3º Conde de Vila Real, D. José Luís de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, que os plantou e que procedeu ao desvio do caminho público que passava junto à fachada principal, criando um amplo espaço que permitiria concretizar o projeto de um novo jardim, a poente da casa, com o imenso tanque da autoria do arquiteto paisagista Gonçalo Ribeiro Teles (1957) e concluída em 1963. Da água, eleva-se uma escultura em mármore de uma figura feminina deitada, de autoria do escultor João Cutileiro (1981), vulgo “A Boneca”.

A planta da casa inscreve-se num retângulo e divide-se em dois quadrados vazados ao centro, que criam várias alas e compõem dois pátios ligados entre si ao nível do piso térreo. O pátio frontal é aberto enquanto que o posterior é fechado. O acesso ao piso nobre faz-se por duplas escadarias que se repetem nas fachadas transversais dos dois pátios, duas a poente e uma a nascente. Os pátios definem um eixo central que atravessa toda a construção, corta o edifício e prossegue pelos diferentes níveis de patamares ajardinados. Existe efetivamente um eixo nascente poente que atravessa a casa e organiza o espaço para além dela. Partindo do grande lago e passando pela casa, prossegue ao encontro dos jardins mais antigos da casa, junto à fachada nascente e a que se acede por uma escada. A tradição atribui a iniciativa deste jardim na fachada posterior a Diogo Álvares Botelho Mourão (1673 - 1744), arcediago da Covilhã e irmão do 3º Morgado de Mateus. Atualmente, o jardim tem o desenho que lhe foi atribuído pela Condessa de Mangualde e organiza-se em torno de uma pequena fonte redonda com os canteiros de buxo radiais em relação a esta. O seu autor é o engenheiro agrónomo Gomes de Amorim, que dirigia os jardins da Câmara Municipal de Lisboa, assinou os trabalhos da Exposição do Mundo Português, de 1940, e morreu ao lado do ministro Duarte Pacheco, em acidente de automóvel ocorrido em 1943. Na parte nascente deste terraço, existe um pequeno bosquete de camélias e nos canteiros estão plantadas rosas. Deste jardim, acede-se aos restantes jardins a sul, à capela e ao icónico túnel de cedros. O túnel já foi plantado por D. Francisco de Albuquerque, instituidor da Fundação, prolongando o eixo central e dando acesso a um arruamento com uma pérgula suportada por pilastras de granito, que se pensa serem provenientes do século XVII. Continuando por este caminho, em direção ao antigo Lagar de Azeite, situado junto à ribeira das Toirinhas, acede-se aos campos da quinta.

Regressando à Casa, impressiona apercebermo-nos da brutal obra de construção para assentar a Casa, suportada por enormes muros de granito. Os jardins assentam em cotas diferentes, tirando partido da colocação de ramadas encostadas aos muros, por onde passa o sistema de condução de água para rega. Sobre amplos terraços situados a norte e a sul da escadaria, coberta pelo túnel dos Cedros, D. Francisco de Albuquerque instalou, ao longo das décadas de 1930 e 1940, três jardins. A norte, o Jardim de Água, com três lagos desenhados pelo arquiteto António Lino (1909-1969), também ligado à Exposição do Mundo Português. A sul, foram reformulados os jardins de buxo. O primeiro, o Jardim das Flores apresenta-nos canteiros de buxo destinados a flores de estação. O segundo, o Jardim das Coroas, segue o desenho do pintor Paulo Bensliman (n.1906), com canteiros desenhados em arabescos aparados rente ao chão. No lado nascente, tem um frontão de pedra – oriundo de um dos pátios da casa – que esconde uma pequena escada que permite aceder aos campos em direção ao vale. No terraço situado ao longo da extensa fachada sul da casa, foram instalados vários canteiros de buxo delimitados por caminhos com arcos de buxo, onde, em substituição do Pomar de Recreio de iniciativa da Condessa de Mangualde, foi instalada, em 2019, uma vasta coleção de rosas, segundo um projeto da arquiteta Teresa Nunes da Ponte. O caminho de remate do jardim conduz ao Barrão, ao lado do grande lago da entrada, com a sua imensa eira e o tanque. A partir daqui, acede-se aos espaços de cultivo da quinta, começando pelos vastos pomares de fruta onde ainda hoje pontuam exemplares notáveis de fruteiras do tempo de D. Francisco de Albuquerque: macieiras, pereiras, cerejeiras. Percorrendo os caminhos do pomar, temos uma vista notável sobre a Serra do Marão, com a impressiva Fraga da Ermida em pano de fundo, e sobre as vinhas e as matas da quinta. Neste particular, a produção vinícola assume uma especial importância, relevada pela associação da Fundação com 14 outros produtores da Região na Lavradores de Feitoria. Mais ao longe, fica a Quinta de São João, recentemente reintegrada no património da Fundação e a ser alvo de um projeto de intervenção.

Nos últimos anos, a Fundação empreendeu um processo de interrogação e intensificação da sua ação que procura definir o lugar de uma instituição cultural perante as exigências da contemporaneidade, num território tão específico como aquele que é definido pela cidade e pela região em que se inscreve. O cinquentenário da Fundação, assinalado com uma programação intensa que se inicia em 2020 e se prolonga até 2022, surge como uma oportunidade para celebrar, refletir e compreender a herança secular e desenhar, ancorados no passado que o património transporta, os caminhos do futuro.

O património natural da Casa de Mateus é, assim, o resultado complexo de um conjunto que parte dos jardins formais, mas que apenas se completa com uma compreensão de todo o complexo agrícola e florestal, bem como do seu valor ambiental. Para além da certificação biológica em curso, a Fundação empreenderá nos próximos anos, a propósito da comemoração do seu cinquentenário, um amplo programa de compreensão e regeneração dos espaços naturais que integrará num único conceito as dimensões paisagística, produtiva e de sustentabilidade.

Monumento Nacional, Decreto de 16-06-1910, DG, n.º 136 de 23 junho 1910

Inventário: Teresa Albuquerque e Teresa Andresen - janeiro 2020

inserido na ROTA DO DOURO

Casa de Mateus

(consultada em janeiro de 2020)
BOWE, Patrick - Jardins de Portugal, Lisboa, 1989
CARAPINHA, Aurora e TEIXEIRA, J. Monterroso - A Utopia com os Pés na Terra. Gonçalo Ribeiro Telles, Lisboa, 2003, pág. 264
CASTELO-BRANCO, Cristina – Solar de Mateus. Jardins de Portugal. CTT Correios de Portugal, 2014 pp. 35-38
CARITA, Helder, HOMEM CARDOSO, António - Tratado da Grandeza dos Jardins em Portugal ou da originalidade e desaires desta arte, 1990, p. 251, 252, 257, 258, 260, 264, 270 - 274
FUNDAÇÃO CASA DE MATEUS - A Casa de Mateus. Roteiro. 2ª edição 2010.
http://www.casademateus.com/visitas-enoturismo/os-jardins/
http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=7011

Fundação da Casa de Mateus