Palácio de Santos-o-Velho
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Palácio de Santos-o-Velho
A Embaixada de França, também conhecida por Palácio de Santos-o-Velho, ou Palácio do Marquês de Abrantes, localiza-se no bairro da Madragoa, na zona central de Lisboa junto ao Tejo. A presença do rio é muito marcante neste local, encontrando-se actualmente a cerca de 250 m dos seus muros, que outrora eram banhados pelo rio. A área da propriedade é de cerca de 7500 m2 e o jardim ocupa cerca 4000 m2. O palácio chegou a ser paço real na época dos Descobrimentos e é hoje um importante exemplar da arquitetura portuguesa, com várias campanhas de melhoramentos para as quais também contribui o arquiteto João Antunes na primeira metade do séc. XVIII (Carita, 2007). Os salões do palácio abrem para os jardins dispostos em terraços, com exposição Sudeste e largas vistas para o Tejo. Neles estão bem presentes as características dos jardins portugueses, designadamente a água, as vistas profundas, a vegetação diversa que inclui árvores de fruto, e os azulejos (Castel-Branco, 2010).
Este lugar foi habitado no período romano, sendo na época do Imperador Diocleciano (284 – 305 D.C.) que o local ganha importância com a construção de uma ermida em memória de três mártires: Veríssimo, Máxima e Júlia, martirizados por confessarem a sua fé cristã, dizendo a lenda que foi aqui que os seus corpos foram encontrados e sepultados. Em sua memória o lugar passou a ser chamado de Santos, apesar de se terem apagado já estes vestígios (Carita, 2007, p.79).
Após a conquista de Lisboa aos Mouros (1147), D. Afonso Henriques manda erguer sobre as ruínas da ermida a nova Igreja de Santos, e D. Sancho I doa a Igreja à Ordem dos Cavaleiros de Santiago, que depois passa para as Comendadeiras de Santos, que ficam assim proprietárias da igreja e Convento durante muito tempo (Carita, 2007, p.79).
Em 1490, as Comendadeiras e as relíquias dos Santos Mártires passam para o novo Convento de Santos-o-novo, e a Igreja é alugada a Fernão Lourenço. A antiga Igreja e Convento ganham o nome de Santos-o-Velho e são transformados numa bonita e confortável habitação de luxo, o Palácio de Santos-o-Velho. D. Manuel I, interessado em habitar o palácio (D. Almeida, 1931, pp. 8-9) faz um contrato de cedência do palácio com Fernão Lourenço e um contrato de aforamento por três vidas com as Comendadeiras, celebrados em 1497. No mesmo ano, é neste palácio que ocorrem as cerimónias do seu casamento com D. Isabel, e o Rei manda fazer importantes obras no palácio que ficaram a cargo do arquiteto João de Castilho (Carita, 2007, pp. 80-81).
Em 1541, D. João III cede o palácio a D. Luís de Lancastre, seu amigo, que aí manda fazer obras. Desde então, os Lencastre ganharam um forte apego a este local, tentando por várias gerações tornarem-se os proprietários da habitação (Carita, 2007, p. 82). Nessa época, D. Sebastião habitou o Palácio de Santos permitindo, no entanto, a presença de D. Luís de Lancastre no palácio até à sua morte e durante a vivência de D. Sebastião, que o palácio de Santos viu pela última vez em 1578, pois foi do jardim que o rei Portugal partiu para a trágica batalha de Alcácer-Quibir. Com o desaparecimento de D. Sebastião, D. Filipe II de Espanha toma posse do trono de Portugal e o palácio é deixado ao abandono até 1629 (Carita, 2007, pp. 82-86), ano em que D. Francisco Luís de Lancastre, 3º Comendador-Mor de Avis, consegue adquiri-lo, obtendo de D. Filipe IV as devidas licenças para a sua compra às Comendadeiras (D. Almeida, 1931, p 14-15), passando o palácio de Santos-o-Velho para a posse dos Lancastre durante os próximos dois séculos. Em 1848, D. José Maria da Piedade de Lancastre, 6º Marquês de Abrantes instala-se no palácio (D. Almeida, 1931, p 14-15) até 1870, e depois da sua morte, o palácio é alugado à legação de França, chefiada pelo Conde Armand até que, em 1909, é comprado pelo Estado Francês à família Lencastre (D. Almeida, 1931, p 14-15).
Hoje em dia, as vias que limitam o palácio são a Calçada Ribeiro Santos e o Largo de Santos. Na proximidade do palácio, a Sul, encontra-se a Avenida 24 de Julho, a Linha de caminho-de-ferro de Cascais e a Avenida de Brasília na zona do aterro da Boa Vista, que alterou por completo a relação entre o palácio e o rio Tejo, da qual existem ilustrações e cartografia que mostram os muros do palácio outrora em contacto com o rio, e que hoje dista dele cerca de 250 m.
Segundo os cronistas do século XV – XVI, era possível entrar para o palácio de barco a partir de um ancoradouro próprio na margem do Tejo com uma casa de madeira colocada sobre a água, que tinha ligação aos jardins do Palácio. Em 1504, após as obras de João de Castilho no Palácio, os jardins descem em patamares até ao rio Tejo.
No fim do século XVI, D. José de Lencastre realiza obras no palácio, criando uma fachada Norte voltada para a rua, acrescento esse que aparece numa iluminura de Simon de Benim que apresentava a fachada do edifício descendo até às margens do rio Tejo, com um laranjal encerrado por muros que chegavam ao rio.
Com a venda de terras pelos Marqueses de Abrantes os jardins foram reduzidos às dimensões que tem hoje (Carita, 2007), como se pode evidenciar na Carta Topográfica de 1911 da cidade de Lisboa de Silva Pinto que confrontam com a Cartografia de 1856 de Filipe Folque onde é evidente a maior dimensão do jardim para Nascente.
Desde 1950 até à actualidade a composição arquitectónica do edifício e os limites do palácio não sofreram grandes alterações, nem o jardim foi alterado, à exceção da vegetação em canteiros irregulares que foi substituída por relvado, para a realização de coquetéis, função necessária à atividade da embaixada.
O terraço do relvado é suportado por uma escadaria de dois lanços que tem gravada numa das pedras a data de 1966. Uma fonte incluída no vão de escada é encimada por um brasão.
Os jardins mais abaixo são formados por um laranjal e pomares privados, que ocupam terraços a diferentes cotas. O antigo muro alto que separava o jardim da praia fluvial manteve-se, no entanto, com o aterro, os muros já não são tocados pelo rio Tejo e o conjunto vive hoje encaixado na cidade e limitado por ruas.
As vistas são o elemento que mais sobressai no jardim da Embaixada de França, criando aberturas do jardim sobre o estuário do Tejo até à outra banda, vendo-se ao fundo o perfil da Serrada Arrábida.
Do conjunto da vegetação destaca-se uma Ficus de grande porte e uns Jacarandás, tendo-se recentemente abatido uma Phoenix canariensis por doença e uma Phitolaca dioica caída por causa de um temporal. As diferenças de cotas dos vários patamares permitem uma grande variedade de arbustos originários de muitas regiões, desde bananeiras, strelitzias, agaves e agapantos de caracter subtropical a camélias das regiões temperadas. Em relação à vegetação atual podemos encontrar no jardim uma grande variedade de espécies diferentes, na zona A podemos encontrar espécies como Phytulaca dioica (ombu), Monstera deliciosa (Costela-de-adão), Ficus pumila (unha-de-gato), Camellia japonica (camélia), Nephrolepis exaltata, Agaphantus praecox (coroas-de-enrique), Justicia brandegeana, Nerium oleander, Musa acuminata (bananeira), Madressilva, Magnolia grandiflora, Mistura de Festuca (relvado). Na zona B encontramos espécies como Strelizia regina, Stenotaphrum secundatum (relvado), bambu, Juniperus communis, Cotoneaster spp, Cotoneaster spp, Hedera helix, Buxus sempervirens, Ficus pumila, Agaphantus. Na zona C encontra-se espécies como Solanum cantonetii, Citrus limon (Limoeiro), Celtis australis (Lódão-bastardo), Agave atenuata, Nerium oleander, Asparagus setaceus, Ipomoea purpurea (Corda-de-viola), Lantana camara, Justicia brandegeana, Spiraea cantoniensis. Na zona D encontram-se espécies como o Schinus mollis, Eriobotrya japonica (Nespereira), Citrus sinensis (Laranjeira), Agaphantus (lírios-do-nilo), Iris reticulata, Zantedeschia aethiopica (Jarros), Narcissus (Narciso), Helichrysum stoechas, Freesia refracta (Frésias), Mentha (Hortelã), Lavandula luisieri (Lavanda). E finalmente, na zona E, encontram-se espécies como Hedera helix e o Nerium oleander.
Edifício e jardins incluídos na Zona Especial de Proteção conjunta do Museu Nacional de Arte Antiga (v. IPA.00003153), da Igreja de São Francisco de Paula (v. IPA.00002621), do Convento das Trinas do Mocambo (v. IPA.00003151) e do Chafariz da Esperança (v. IPA.00004943).
Texto de Inventário: Beatriz L. Monteiro. – 2020.
Adaptação e revisão: Cristina Castel-Branco – 2020.
Palácio de Santos-o-Velho
(Consultada em julho de 2020)
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Documentos não publicados - Manuscritos
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“Obras sem nenhuma importância – Santos” - Recibos de João Baptista Neves para o Ministro de França. Arquivo da Casa de Abrantes – Livro 226 – Cota 4581 – Manuscritos Avulsos, Arquivo nacional da Torre do Tombo. <br/>
Contrato de arrendamento de 1879 à Legação de França. Arquivo da Casa de Abrantes – Arquivo Nacional da Torre do Tombo Livro 226- Cota 4580, 1879. <br/>