Quinta da Piedade
Lisboa | Sintra
Quinta da Piedade
A Serra de Sintra é sem dúvida um lugar único, estando classificada como Património Mundial e como a primeira Paisagem Cultural, pela UNESCO em 1995. Ligado a esta Serra ímpar está a figura de D. Fernando II, jovem rei alemão, que aos 22 anos compra os terrenos do topo da Serra de Sintra e constrói a partir de 1840 a primeira obra mais marcante do romantismo em Portugal, o Parque e Palácio da Pena (Castel-Branco, 2002). A riqueza cultural de D. Fernando, o seu gosto pela natureza, a sua educação artística e o seu interesse por áreas como a botânica vieram dar um incremento e um interesse à arte de construir jardins. Sintra foi então um núcleo difusor deste novo entendimento e gosto pela Natureza em Portugal. Seguindo o exemplo e a influência do Rei, foram construídas em Sintra, outras residências de veraneio, tornando-se um lugar onde surgem muitos palácios, parques e jardins criados no seculo XIX e com localizações de exceção pela vista, pela abundância de água e pela beleza da Serra.
Na várzea de Colares, localizavam-se já quintas antigas ligadas à exploração vinícola com casas, capelas e adegas (Binney, 1987) e nas encostas da Serra de Sintra nos terrenos da Casa Cadaval encontramos hoje em dia as três Quintas dos Duques de Cadaval, divididas a partir dessa vasta propriedade do seculo XVI: Quinta da Piedade, a Quinta da Bela Vista e a Quinta da Capela.
A Quinta da Piedade recebe o nome da Capela da Piedade, local de peregrinação que lhe fica adjacente, e situa-se na localidade de Eugaria, com uma área aproximadamente de nove hectares. A casa tem origem no início do século XIX, e é construída por iniciativa do quinto duque do Cadaval, D. Miguel, que morre no Brasil para onde tinha partido para acompanhar o rei durante as invasões francesas em 1807 e sem ver a obra terminada (Stoop, 1999). A família Cadaval vai acompanhar a facção absolutista das Guerras liberais o que a leva ao exílio durante décadas e a Quinta da Piedade em abandono por quase cem anos.
No início do século XX, a nova Marquesa de Cadaval, Olga Maria Nicolis di Robilant Álvares Pereira de Melo, e o seu marido D. António Álvares Pereira de Melo, regressam a Portugal e recuperam a quinta e em 1935 fazem ampliações á casa e principiam a construção do jardim.
A Marquesa de Cadaval ficará sempre conhecida em Sintra pelo seu jardim onde cultivava o seu interesse cultural e artístico, com vivência quase permanente com grandes artistas que frequentavam a sua casa e o seu novo jardim, este foi projetado com o objetivo de ser também uma sala de música onde se vieram a fazer os famosos festivais de Sintra com atuações de prestigiados artistas.
O jardim da Quinta da Piedade é concebido nos anos 30, uma época em que estava em voga a construção de diversas zonas mais reservadas no interior do jardim, como se se tratasse de uma extensão da casa. Cada uma destas zonas apresenta uma função, como exemplo, a casa da música, o jardim de buxo em topiária, as fontes, a zona das camélias, a piscina, e o miradouro. O Jardim é construído em terraços suportados por muros. Nas zonas mais baixas, aproveitando os socalcos existentes, produto do anterior aproveitamento do terreno para fins agrícolas, foi plantada uma vinha.
O jardim encontra-se na meia encosta, virado para a Várzea de Colares, mas com vistas sobre as colinas onde assentam o Palácio de Monserrate, a quinta da Penha Verde, o Palácio de Seteais e no topo de festo superior o Palácio Nacional da Pena. É composto por diversos elementos arquitetónicos, destacando-se a cúpula do palco e o jardim formal de buxo em topiária, onde se realizam concertos de música clássica, no âmbito do Festival de Música de Sintra.
Aqui, neste patamar centrado num eixo de simetria, existem canteiros de buxo, fontes bancos, muros e um pavilhão revestidos a azulejos azuis e brancos, representando pássaros, cenas de comédia italiana e cenas campestres, que datam na sua maioria do primeiro quartel do século XVIII. Não sendo originais foram trazidos da Quinta Salgada em Chelas e de uma escola destruída em Sacavém (Stoop, 1999).
O pombal, situado na orla da mata, atrai imediatamente o olhar como elemento cénico, que nos jardins paisagistas do seculo XVIII é conhecido por eye-catcher. Perto deste foi recentemente aberta uma charca em tela com o propósito de armazenar a água fornecida pela Quinta da Capela, apresenta um carácter bastante rural, tendo sido projetada com um objetivo funcional e não estético. Por outro lado, um dos pontos fortes do caminho que leva à charca e ao pombal é sem dúvida a vista que temos sobre praticamente toda a propriedade, desde a casa, a cúpula, o jardim formal, a vinha, até à Várzea de Colares e Oceano Atlântico.
Os elementos de água, da quinta e jardim, dão valor ao conjunto e destacam-se as fontes, localizadas no jardim formal de buxo no patamar da cúpula e no jardim das camélias (localizado no patamar do Palácio), e os tanques, em tempos usados para armazenar a água que vinha de minas situadas nas quintas superiores, para depois ser distribuída pelas caleiras de pedra muito antigas que acompanham os caminhos de toda a propriedade e asseguravam as regas.
O jardim das camélias, é outra zona especial do jardim, mais resguardada e íntima, com exemplares raros de camélias trazidos de diversos sítios, nas viagens feitas pela Marquesa de Cadaval, entre elas as visitas a Coimbra à Irmã Lúcia. No centro encontra-se uma fonte em forma de estrela de oito pontas. O jardim apresenta uma diversidade de espécies escolhidas para se desenvolverem bem no ambiente da Serra de Sintra, entre elas: Camellia sp. (camélias), Agapanthus praecox, Hydrangea macrophylla (hortênsias), Zantedeschia aethiopica (jarros), Strelitzia reginae (estrelícias), Buxus sempervirens (buxo), Cupressus sempervirens (Ciprestes), Aloe arborescens, Crocosmia sp., Chorisia speciosa, Myrtus communis (murta), Lagerstroemias, Cupressus sempervirens e as espécies habituais da mata de Sintra; pinheiros, sobreiros, eucaliptos e medronheiros.
O acima referido miradouro encontra-se mais escondido, a Norte da propriedade e é composto por um bom pavimento em laje e bancos e uma arcada palaciana que serve como moldura e desvenda a vista magnífica sobre a Serra e a Várzea, sendo um perfeito belvedere para desfrutar a beleza da Serra. A vinha e a zona agrícola situadas no último patamar da propriedade, descem até uma linha de água que atravessa a Quinta da Piedade e desagua na ribeira de Colares.
Texto de inventário: Carolina Esteves, 2020.
Revisão: Cristina Castelo-Branco, 2020.
Quinta da Piedade
(Consultada em Setembro de 2019)
BINNEY, Marcus. Country Manors of Portugal. Lisboa: Difel, 1987. pp. 42-44.
PEREIRA, Artur D.; CARDOSO, Felipa Espírito Santo; CORREIA, Fernando Calado. – Sintra e suas Quinta. Sintra: Edição dos Autores, 1983, p.66 .