Quinta do Barão / Quinta da Lapa

Lisboa | Cascais

Quinta do Barão / Quinta da Lapa

A Quinta do Barão, também conhecida como Quinta da Lapa, localiza-se em Carcavelos, a cerca de 2 km da praia da Torre, numa encosta de inclinação suave, que sobe brandamente desde a costa. A exposição sul, disponibilidade de água subterrânea para rega, solos calcários de boa fertilidade e ventos predominantemente de Norte, que evitam a penetração excessiva de salsugem e areias marítimas, proporcionam um microclima ideal para a produção agricultura, mas especialmente o cultivo da vinha e a produção de vinho. A excelência das vinhas de Carcavelos era já referida em 1370, na carta de aforamento da vila a favor de Álvaro Pais, tendo atingido o auge da sua fama durante o séc. XVIII e XIX quando o Marquês de Pombal compra a Quinta de Cima e de Baixo e passa a explorar uma grande adega local, levando o vinho de Carcavelos a conquistar o tão desejado mercado Inglês. A Quinta do Barão torna-se assim numa das quintas produtoras de tão famoso vinho de Carcavelos, a par da Quinta do Marquês de Pombal e Quinta da Bela Vista suas vizinhas. Carcavelos seria então uma zona rural, povoada de Quintas e de vinhas, um senário hoje difícil de imaginar numa região onde a agricultura foi há muito abandonada para dar lugar à expansão urbana e a fama dos bons vinhos foi ultrapassada pela fama das excelentes praias.

As referências mais antigas à Quinta do Barão remontam à sua compra, em 1770, por parte de Jacinto Isidoro de Sousa, um afamado mestre de obras e arquiteto, responsável pela parte final das obras do Palácio do Marquês de Pombal em Oeiras. Jacinto de Sousa construiu aí uma primeira habitação e jardins de influência barroca, provavelmente inspirados no traçado do Palácio do próprio Marquês onde ele próprio trabalhou, e fazendo-se valer do conhecimento adquirido ao longo dos seus vários anos de experiência. Aí habitou com sua esposa, Joaquina Teodora de Sousa, por vários anos, tendo-se imortalizado a ambos num painel de azulejos setecentista policromado, rococó de estilo rocaille achado na fachada sul do solar junto à entrada principal. 

Após a sua morte, em 1794, a viúva Dona Joaquina de Sousa vende a propriedade a José de Almeida e Vasconcelos, primeiro barão de Mossâmedes, primeiro Visconde da Lapa e governador da praça de Cascais. O Barão procede então a grandes reformas na Quinta, remodelando o interior da casa e mandando plantar a vinha. Rapidamente a Quinta do Barão começa a ganhar fama, tanto pela qualidade do seu afamado vinho de Carcavelos como pela distinção da sua casa que o Barão mandou decorar com “brasões de família […] nos tectos das salas” e “mobiliário sumptuoso” que a recheou “de ponta a ponta” (Colaço e Archer, 1943, p. 221).

Com a morte do 1º Barão de Moçames em 1805, a quinta passa para o seu filho, Manuel de Almeida Vasconcelos, passando a chamar-se Quinta da Lapa aquando da aquisição de novos terrenos para expansão da Quinta, datando dessa época uma placa com a inscrição “Quinta da Lapa D. 1822”. No decurso do séc. XIX a quinta passa de geração em geração, mantendo-se sempre na mesma família. O negócio do vinho teve sucesso e são criadas diversas estruturas visando o apoio da exploração, serviços de gestão e acomodação dos trabalhadores da vindima. Foram assim construídos a Norte do Solar os edifícios que são hoje os escritórios, dormitórios dos trabalhadores, cavalariças e garagens.

Em 1915, são feitas grandes obras de ampliação e modernização da adega, com a compra de 8 novos lagares, vasilhames e maquinaria pelos então proprietários da Quinta do Barão, D. Luísa de Almeida Vasconcelos e seu marido Baltazar Freire Cabral. Não obstante, o início do séc. XX representou tempos difíceis para os gestores da Quinta do Barão, consequência da epidemia da filoxera que praticamente destruiu toda a vinha, reduzindo drasticamente a produção, e obrigando a plantação de milhares de cepas novas. Apesar das adversidades, a marca consegue manter-se no mercado. 

Após a morte de Baltazar Freire Cabral a Quinta entra inevitavelmente numa fase de declínio e acaba vendida a Raul Ferreira, Conde de Riba d’Ave, um homem de negócios nortenho que compra também as Quintas das Palmeiras, Casal da Serra e do Marquês. Raul Ferreira revitaliza a Quinta do Barão, tornando-a novamente num espaço de produção rentável assente na produção do vinho de Carcavelos. Na geração seguinte a quinta morre como unidade de produção agrícola e em simultâneo vai sendo cercadala expansão urbana da área metropolitana de Lisboa. Em 1992 começa o processo que viria a culminar na construção da ligação da A5 à marginal no início do séc. XXI, com o seccionamento da propriedade, desanexando o extremo Oeste e as adegas da unidade principal.

A Quinta encontra-se estruturada a partir do solar numa malha ortogonal de ruas que ligam os vários cómodos. Estes encontram-se dispostos ao longo de uma área retangular central, de orientação Nordeste-Sudoeste, rematada a nordeste pelo solar, capela e casa dos mordomos, a sudoeste pelas cavalariças, garagens, galinheiros e outras dependências, e lateralmente por duas ruas principais, materializadas na antiga “rua das vinhas” a sul, e o eixo viário dos anos 50 a norte. O eixo dos anos 50 faz a ligação do portão da quinta ao núcleo de edifícios destinados aos trabalhadores das vinhas e organização da produção agrícola, que inclui uma cantina, os dormitórios, os escritórios entre outras dependências. O jardim desenvolve-se para sudoeste do Solar e funciona como elemento agregador, ocupando o grande “pátio central” definido pelo complexo edificado.

A casa reveste-se de especial interesse no alçado sul, com dois lanços de escadas que convergem num patamar de acesso ao primeiro piso, encimado por um alpendre apoiado em quatro colunas de cantaria. É aqui que se situa a porta principal, estando todo o piso térreo e muros de suporte à escada revestidos a painéis azulejares com molduras policromas de concheados rococó e cenas figurativas a azul e branco.

No núcleo dos trabalhadores das vinhas, onde se encontram os escritórios, dormitórios e cavalariças, dominam os tons de amarelo que realçam as linhas de força dos edifícios, que na generalidade se encontram em bom estado de conservação.

A Sudoeste do solar, na extremidade oposta da propriedade, situa-se a adega de planta em L e a zona reservada à plantação da vinha. A ligação da zona de vinhas com o edifício principal era feita por um longo eixo viário, conhecido como “rua das vinhas”, adornado por estatuária, que partia da fachada sul da casa, cruzando lateralmente o jardim, e se estendia a direito até à inflexão que fazia depois ligação à adega. O edifício da adega, um antigo espaço de importância central da quinta, apresenta azulejaria de A. Gaspar (c. 1900) venerando Baco, deus dos vinhos e da poesia. Hoje em dia a “rua das vinhas” encontra-se interrompida pela construção da ligação à A5, isolando a adega do outro lado da via com consequentes problemas de conservação. 

O jardim a poente da casa senhorial é marcado pela variedade das espécies vegetais em presença e admite-se que a sua construção remonta à época de construção da casa, estando originalmente organizado em torno de um eixo de simetria que partia do solar para sudoeste, em direção a um ponto focal hoje desaparecido. É provável que a sua conceção tenha tido influência do convívio de Jacinto Isidoro de Sousa com o arquiteto húngaro Carlos Mardel aquando da construção do palácio do Marquês de Pombal.

A acompanhar o eixo principal do jardim existem dois outros paralelos com início nas laterais do solar e que se prolongam para a antiga zona de produção, um é a antiga rua das vinhas anteriormente referida, e o outro é um alinhamento em parte desaparecido que termina num ponto focal materializado num edifício de planta octogonal, hoje em dia em ruínas. O seu uso inicial permanece um mistério, podendo ter sido uma pequena capelinha ou casa de fresco, encontrando-se no seu interior uma pequena figura orientada a Sudoeste, que se presume ser o padroeiro da quinta, sob uma fonte que lhe serve de suporte.

O jardim é constituído por vários canteiros de buxo simples, com alguns arbustos topiados em forma de bola e pirâmide a marcar os eixos. Ao longo da sua área encontramos várias estátuas e bustos de pedra perfazendo um total de oito, quatro lagos e fontes, um antigo tanque, um pombal e ainda um espaço rodeado a muretes com namoradeiras revestidos a painéis de azulejo neoclássicos remontando ao início do séc. XIX. 

Em 1951 os jardins sofreram uma forte remodelação que resultou na configuração que hoje se observa. A fonte que se localizava no pátio junto à escadaria de acesso ao segundo piso, na alçada sul do solar, é movida para a alçada Sudoeste, formando um novo eixo no jardim que liga a um recém-construído tanque de forma poligonal irregular. A rodear a recém relocalizada fonte foram colocadas quatro estátuas alegóricas das estações do ano, ainda presentes. Terá também sido nesta época que se construíram as duas pérgulas sob os dois eixos principais do jardim. 

Hoje em dia o jardim é mantido pelo mordomo da Baronesa, contudo encontra-se já descaracterizado, consequência das várias intervenções da quinta que negligenciaram a sua estrutura.

Classificado como Imóvel de Interesse Público em 2002 segundo o Decreto n.º 5/2002, DR, 1.ª série-B. n.º 42 de 19 fevereiro, atualizado depois com Portaria n.º 402/2010, DR, 2.ª série, n.º 114 de 15 junho 2010, que defina a sua Zona especial de proteção que inclui a Quinta e jardins.

Texto de Inventário: Bruno Marques – 2006; Catarina Folque – 2006.

Adaptação: Guida Carvalho, 2020.

Revisão: Cristina Castel-Branco, 2020.

Quinta do Barão / Quinta da Lapa

(Consulta em 2006 e Abril de 2020)

COLAÇO, Branca de Gonta; ARCHER Maria. – Memórias da Linha de Cascais. Cascais: Câmara Municipal de Cascais e Câmara Municipal de Oeiras, 1943.
COSTA, Américo – Dicionário Corográfico de Portugal Continental e Insular, Vol. IX, Porto: Tipografia Domingos de Oliveira, 1947. LENCASTRE, D. José Coutinho de – Passeio de Lisboa a Cascais, Lisboa, 1868.
MORAIS, Prazeres do Céu. – O Vinho de Carcavelos. Abordagem Histórico-Geográfica, in Arquivo de Cascais, nº 9, Cascais, 1990.
SIMÕES, João Miguel dos Santos – Azulejaria em Portugal no Século XVIII. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1979.
SILVA, Raquel Henriques da – A Arquitectura de Veraneio em S. João do Estoril, Parede e Carcavelos - 1830-1930. Arquivo de Cascais, nº 7, Cascais, 1988.
STOOP, Anne. – Quintas e palácios nos arredores de Lisboa. Barcelos: Livraria civilização, 1986.
http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=3195
http://www.patrimoniocultural.gov.pt/en/patrimonio/patrimonio-imovel/pesquisa-do-patrimonio/classificado-ou-em-vias-de-classificacao/geral/view/72823

Avenida D. José I, Carcavelos