Quinta do Marquês de Pombal

Lisboa | Oeiras

Quinta do Marquês de Pombal

A Quinta do Marquês de Pombal localiza-se no município de Oeiras, na margem Norte da Área Metropolitana de Lisboa. “O concelho de Oeiras, como arrabalde da capital, debruçado sobre a ‘barra’ do rio Tejo, foi inevitavelmente procurado para a construção de propriedades senhoriais, as ‘Quintas de Recreio’, misto de explorações agrícolas e espaços de ‘prazer’, ordenados como extensos parques” (Dias, 1993, p. 17).

A história desta quinta remonta ao século XVII, mais exatamente a 1676, quando Sebastião José de Carvalho, avô do futuro Marquês de Pombal, adquiriu uma série de terras, onde, posteriormente, a Quinta de Oeiras, então designada Morgadio de Oeiras, viria a implantar-se.

Em 1714, o Arcipreste da Patriarcal de Lisboa, Paulo de Carvalho e Ataíde (1679-1737), tio do futuro Marquês, adquiriu inúmeros terrenos circundantes e mandou erguer um solar, que deixou em testamento a Sebastião José Carvalho e Melo. Em 1750, Sebastião José regressa a Portugal após um longo período no estrangeiro, ao ser nomeado para o cargo de Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, por D. José I (1714-1777). Desta forma era necessário dotar o Palácio de Oeiras de todas as comodidades para que a família Carvalho ali habitasse de acordo com a condição social a que aspirava, que mais tarde se veio a concretizar nos títulos de Conde e posteriormente de Marquês. O palácio é engrandecido, criam-se os jardins e diversos núcleos de recreio, transformando-se a velha Quinta numa grandiosa quinta de Recreio e Produção estruturado sobre um eixo barroco e com espaço de lazer e agricultura como a casa da pesca, a abegoaria, o pombal e toda a estrutura de caminhos que os liga.

As obras do Palácio e Jardim, da autoria do engenheiro-militar húngaro Carlos Mardel (1695-1763), foram concluídas em 1775, aproveitando o Marquês de Pombal para convidar a corte de D. José I a desfrutar do Verão na sua propriedade. O jardim à la française ao estilo de André Le Nôtre terá tido influência da condessa austríaca Leonor Daun (1721-1789), segunda mulher de Sebastião José de Carvalho e Melo, que terá contribuído de forma útil para o requinte construtivo das áreas de recreio.

Ao Rei D. José sucedeu, em 1777, a sua filha D. Maria I, que acusou o Marquês de Pombal de abuso de poder, corrupção e fraude, tendo-o desterrado para Pombal, onde morreu em 1782. Após a visita da rainha D. Maria I à Quinta, em Agosto de 1783 (Leal, 1873 -1890, p. 213), a mesma foi votada ao esquecimento, e só um século depois, aquando da comemoração da morte do Marquês, se voltará a ouvir falar da propriedade. Em 1939, os descendentes do Marquês vendem a Quinta a Artur Brandão, que se desfez do seu recheio e a revende em 1958, repartindo-a: o palácio e os jardins da Quinta de Baixo são adquiridos pela Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) e a Quinta de Cima adquirida pela Estação Agronómica Nacional. Cerca de vinte anos depois, a FCG cede o espaço ao Instituto Nacional de Administração, após movida a Coleção Gulbenkian. Atualmente, a quinta encontra-se sob a tutela da Câmara Municipal de Oeiras, que adquiriu o imóvel e os seus jardins, em 2003.

O jardim é inovador para a época introduzindo o conceito de jardim barroco em eixo aberto para a paisagem rural que o envolve. A área agrícola integra a maioria dos elementos de recreio, dos quais as cascatas e fontes se destacam pelas suas dimensões e grandiosidade. Se em Versailles é a bassin de Latone que sobressai, em Oeiras, nos Jardins da Quinta do Marquês de Pombal, é a Cascata dos Poetas que capta a direção visual no eixo, “apresentando um corpo central mais elevado ladeado por 2 pavilhões de planta quadrada, com bustos de Homero, Virgílio, Tasso e Camões, da autoria de Joaquim Machado de Castro” (monumentos.pt). O jardim é desenhado segundo eixos e ruas arborizadas, oferecendo perspetivas e vistas da propriedade e da paisagem envolvente. Aqui se encontram vários elementos ornamentais como casas de fresco, aquedutos, noras e miradouros, que constituem percursos ornamentados não só pelos elementos de água, mas também pelas espécies vegetais aqui presentes, como laranjeiras, loureiros e buxos.

Sendo Portugal um país de clima semiárido, houve a necessidade de estudar e aproveitar os recursos hídricos de superfície e hidrogeológicos, de modo a poder obter efeitos paisagísticos, que seguissem os parâmetros do novo estilo de André Le Nôtre. Desta forma, os jardins da Quinta são implantados na várzea, com o intuito de proporcionar uma zona ajardinada sem desníveis significativos, onde as escadarias são substituídas por alamedas extensas. Aproveitando as preexistências e pondo em prática os ensinamentos de Le Nôtre, o declive das encostas é colmatado com olivais e mata, onde se irão encostar as cascatas. O traçado irá, assim, projetar todo o ordenamento paisagístico, assentando sobre um eixo principal, a Rua dos Loureiros, que agrega as duas quintas (Quinta de Cima e Quinta de Baixo), estando estas separadas por um eixo secundário, a Estrada Real, permitindo, assim, a continuidade da Quinta. Em conformidade, todo o jardim é desenhado sobre eixos traduzindo uma hierarquia de espaços que se desenvolve progressivamente para o exterior e articula o palácio com o jardim e os vários talhões da quinta. A decrescente intimidade dos espaços é identificada não só pelos revestimentos de azulejo e pela estatuária, mas também pela própria morfologia do terreno, organizado segundo cotas diferentes (Pereira de Lima, 2006, Monumentos.pt).

A par do eixo principal, a Rua dos Loureiros, encontramos outros dois eixos do outro lado da ribeira com orientação Norte-sul sobre o vale. O primeiro destes dois eixos tira partido da modelação do terreno em patamares, situando-se a uma cota superior, proporcionando vistas panorâmicas sobre a Vila e elementos cenográficos e decorativos, dos quais o Pombal e a fachada da Casa dos Coches são exemplo. Por sua vez, o segundo eixo simétrico em relação à Rua dos Loureiros, acompanha a ribeira-canal na maioria da sua extensão, localizando-se na outra margem.

A partir de eixos secundários perpendiculares, os três eixos principais ligam-se entre si, originando uma malha geométrica. Para o extremo Norte, é de destacar a convergência intencional dos eixos, onde se localiza o conjunto da Casa de Pesca e da Cascata do Taveira, ambos elementos de destaque, a Casa de Pesca pela sua ornamentação estucada alusiva à atividade piscatória, e a cascata do Taveira, pelo seu amplo tanque decangular emoldurado por muros ostentando 16 painéis de azulejo de temática mitológica em azul e branco, inspirados provavelmente em gravuras de Vernet. (monumentos.pt). Esta Cascata desempenha uma dupla função pois, alia esta componente lúdica à rega dos extensos pomares do Marquês de Pombal.

Outros três eixos, que compõem a estrutura axial junto ao palácio, deverão, também, ser salientados: primeiramente, a alameda que guia do terraço das Araucárias à Cascata dos Poetas, desnivelado pela Escada Nova e passando pelo Jogo da Péla; em seguida, o eixo que liga a Cascata dos Poetas à Fonte das Quatro Estações; e, por fim, o eixo que enquadra a fachada da Adega-celeiro, composta com bustos de imperadores romanos, dirige-se para a fachada da Casa dos Coches, ornamentada com um brasão monumental, atravessando a Fonte das Quatro Estações, no centro da Horta Ajardinada, o canal pela ponte obliqua e o antigo bosquete dos Loureiros.

Numa outra malha constituída por eixos visuais, no extremo Norte dos jardins na encosta do vale, elementos decorativos estabelecem os nós de toda a malha: Casa dos Bichos-da-seda, Jogo da Bola e Cascata da Fonte do Ouro, uma plataforma avançada que, tendo como ponto de referência a torre da Abegoaria, permite a perceção de toda a propriedade. Apesar de aparecer desligado da malha geométrica, o Pombal apresenta um conjunto de relacionamentos entre a sua forma, dimensão, posição e os outros elementos presentes no jardim, tendo sido considerado pelo Arquiteto Paisagista Rodrigo Dias como um ponto de fuga, ou até mesmo o ponto de referência de todo o jardim, constituindo, juntamento com a Rua dos Loureiros, o elemento agregador de toda a área recreativa.

Em sobreposição à malha definida pelos eixos, existe uma outra matriz, mais complexa, os eixos visuais que relacionam e integram todos os elementos cenográficos e recreativos entre si: fachadas dos edifícios, pombal, a Cascata da Fonte do Ouro, a Cascata do Taveira, a Rua dos Loureiros, e o palácio e Vila de Oeiras, só para dar alguns exemplos.

A este nível, o Pombal, de planta octogonal adquire principal destaque. Será a partir deste ponto que os eixos visuais prolongarão o jardim para fora dos seus limites, “[...] constituindo pontos de referência ligados a uma simbologia numérica e doutrinária, aliás presente em todos os conjuntos do século XVIII.” (Dias, 1987, p. 31.). Sendo a estrela de oito pontas o símbolo máximo do brasão dos Carvalhos, não será de estranhar os oito lados do Pombal.

 “Fora dos altos muros que cercam o jardim estão plantados os limoeiros – uns em flor outros com limões verdes outros com eles já maduros. Do lado de dentro, macieiras e laranjeiras, estas últimas em ramos vergados pelo peso dos frutos. E por toda a parte, belos canteiros de flores e muitas espécies de arbustos derramando perfumes. Sobre a colina ostentam-se cedros majestosos, e o jardim está todo adornado com figuras de mármore, cuja disposição, sobre inumerosos pedestais também de mármore, dá ao quadro um aspeto variado e romanesco” (Ruders, 1981, p. 123.), afirma Carl Ruders, que visitou a quinta em 1789, servindo de referência para se imaginar a beleza do jardim e quinta.

Segundo Ilídio de Araújo, o pomar e horta são “[…] objecto de particular esmero na escolha do local para a sua implantação, no seu ordenamento interior e, por vezes, até na sua harmonização plástica com a paisagem envolvente, levando o horto a assumir o carácter de obra prima da arte paisagista.” (Araújo, 1979). Este foi desenhado também com o objetivo de produzir bens de consumo, sendo rico em pomares, campos de cultura arvense, prados, matas, hortas e respetivos tanques e fontes, armações para vinha, pombais e estábulos, eram rigorosamente distribuídos ao longo do terreno, aproveitando os recursos naturais presentes no local. As propriedades do Marquês de Pombal em Oeiras englobavam oito olivais, cuja colheita era transformada no Lagar de Azeite da Quinta, sendo, posteriormente, vendido em Lisboa e exportado, a par do consumo próprio.

O resultado final desta acumulação de elementos levou a críticas dos visitantes europeus, que descrevem os jardins, como por exemplo William Dalrymple, “Tive a oportunidade de ver os jardins do Marquês de Pombal e os seus melhoramentos; há cascatas e grandes alas de laranjeiras e limões, mas distribuídas sem gosto [...].” (Dalrymple, 1777, p. 151.), e Arthur Costigan, “[...] os jardins são muito extensos e mal dispostos para recreio e vê-se que houve a intenção de aproveitar tudo. Estão cobertos de laranjeiras, limoeiros e amendoeiras [...].” (Costigan, 1778-1779, p. 82).

Por fim, William Beckford, ainda que fortemente influenciado pela cultura inglesa, rende-se aos pomares e às latadas do jardim: “Depois do jantar, sentei-me na varanda [...] a gozar a briza que brincava muito aprazivelmente por entre as folhas das videiras do novo jardinzinho.” (Beckford, 1983, p. 49), e, em Portugal, Aquilino Ribeiro faz sobressair a distinta majestosidade que a Quinta em Oeiras evoca, “[...] a água das majestosas cascatas descia para formidáveis tanques que, por sua vez, ia irrigar a horta e os agros [...]” (Ribeiro,1924, p. 605).

Hoje em dia o palácio do Marquês de Pombal constitui um importante exemplo de um Palácio rural, integrada em quinta de recreio onde dominam os jardins perfeitamente integrados no espaço rural e que enquadram a Casa da Pesca, Cascatas e Adega. “A articulação entre o palácio e os vários terraços de acesso ao jardim e quinta constitui um espaço intimista que se desenvolve progressivamente por patamares traduzindo uma hierarquia de espaços identificados não só pelos revestimentos de azulejo e pela estatuária, mas também pela própria morfologia do terreno, organizado segundo cotas diferentes” (Monumentos.pt). Entre as construções do jardim merecem destaque pela sua beleza e singularidade a cascata dos Poetas, a cascata da Taveira, a cascata da Mina de Ouro, o pavilhão da casa da Pesca, e ainda a escadaria no exterior do palácio, totalmente revestida de azulejos ilustrando, nas paredes exteriores, episódios da mitologia greco-romana inspirados na pintura francesa.

Considerado Monumento Nacional segundo o Decreto n.º 39 175, DG, 1.ª série, n.º 77 de 17 abril 1953 *1.

Texto de Inventário: Adaptado da Tese de Mestrado de Luísa Correia, - Hidráulica nos jardins barrocos: Análise do uso da água nos jardins barrocos e discussão da influência de André Le Nôtre em Portugal. Instituto Superior de Agronomia, 2015.

Adaptação: Guida Carvalho – 2020.

Revisão: Cristina Castel-Branco – 2020.

inserido na ROTA DA GRANDE LISBOA

Quinta do Marquês de Pombal

(Consulta em 2015 e Janeiro de 2020)
ARAÚJO, Ilídio Alves. – Jardins, parques e quintas de recreio no aro do Porto. In Actas do Colóquio O Porto na época Moderna. Porto: I.N.I.C., C.H.U.P., 1979.
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CARITA, Hélder; CARDOSO, António Homem – Tratado da Grandeza dos Jardins em Portugal : ou da originalidade e desaires desta Arte. [S. l.] : Edição dos Autores, 1987. pp. 199, 201-209, 227, 251, 234-235.
CORREIA, L.M. - Hidráulica nos jardins barrocos. Análise do uso da água nos jardins barrocos e discussão da influência de André Le Nôtre em Portugal. Lisboa: Instituto Superior de Agronomia, 2015. Dissertação de Mestrado.
COSTIGAN, Arthur. – Cartas de Portugal 1778-1779. Lisboa: Círculo de Leitores, 1992.
DALRYMPLE, William. – Travels through Spain and Portugal in 1774; London: printed for J. Almon, opposite Burlington-House, Piccadilly, 1777.
DIAS, Rodrigo – História e “Histórias” do Jardim Francês em Portugal: A Quinta de Recreio do Marquês de Pombal na Vila de Oeiras; Oeiras: Câmara Municipal de Oeiras, 1993.
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FREDERIC, Henry. – Voyage en Portugal depuis 1797-1799. Paris: [s.n.], 1803.
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RIBEIRO, Aquilino. - Guia de Portugal. Vol. I. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1924.
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Largo Marquês de Pombal