Parque do asilo militar de Runa
Centro | Torres Vedras
Parque do asilo militar de Runa
O Asilo Militar de Runa ou Real Hospital dos Inválidos Militares de Runa é atualmente designado por Centro de Apoio Social (CAS) de Runa. Situado num vale aberto rodeado por suaves colinas, encontra-se na Estrada Nacional 248, que liga Torres Vedras à aldeia de Runa, sendo que dista destas cerca de 8 km e 1 km, respetivamente.
No local onde foi edificado o asilo existia uma quinta denominada Quinta de Alcobaça, que pertencia aos frades bernardos, e foi adquirida por D. Maria I (1734-1816) a pedido de sua irmã, Princesa Maria Francisca Benedita (1746-1829). Esta aquisição foi feita a 11 de agosto de 1790, dois anos após a morte do seu marido, D. José, Príncipe do Brasil (1761 -1788). Esta compra tinha já em vista a construção do asilo, pois era vontade expressa de D. Maria Francisca Benedita, que sofreu muito com a morte prematura de D. José, homenagear o interesse patriótico e militar do mesmo, ao ajudar aqueles que necessitavam de um local onde pudessem ser acolhidos e ajudados após o seu serviço em nome da pátria. A 18 de junho de 1792, foi lançada a primeira pedra da construção do asilo, com assinatura do arquiteto José da Costa e Silva (1747-1819), Primeiro Arquiteto das Obras Reais. Este foi o primeiro arquiteto português, estudante dos mestres italianos, a realizar obras neoclassicistas em Portugal, sendo o asilo uma dessas obras. Esta contou com mais de 300 operários e foi a primeira com este intuito em Portugal e a quinta a nível mundial. O Real Asilo, que servia como Palácio-Hospital, contava com um andar nobre, no 3º piso, que tinha como propósito ser o retiro da benemérita que encomendou construção do mesmo. Tinha cerca de 100 alojamentos para militares inválidos e uma igreja. Relativamente a esta, houve uma alteração no desenho original que resultou numa incoerência entre o projeto da cúpula e o que foi executado numa fase posterior da construção. Após 35 anos do início das obras, com demoras devidas a vários obstáculos como a saída da família real para o Brasil, entre 1807 e 1821, levou a que a inauguração do Hospital Real de Inválidos Militares, fosse apenas feita a 25 de julho de 1827, dia do 81º aniversário da benemérita, com a entrada de 16 militares e na qual foi servida uma refeição pela própria. No ano seguinte, a 15 de janeiro, foi recebida a bula papal com o aval de celebração das missas na igreja do asilo. Apenas dois anos após a conclusão da construção do asilo militar, faleceu D. Maria Francisca Benedita que deixou como seu universal herdeiro o asilo, fazendo com que este fosse dotado de variadas loiças, tanto nacionais como orientais, mobiliário nobre, um notável órgão e várias obras de arte, em especial a custódia desenhada pela própria, em prata dourada com variadas pedras preciosas na sua constituição, da autoria do ourives João Paulo da Silva. Após o falecimento da benemérita, o asilo passou por dificuldades financeiras devido à perda de uma propriedade que fornecia uma grande fonte de rendimento, até 1834, ano em que D. Amélia, Duquesa de Bragança, se declarou como protetora do asilo ao fornecer uma doação anual. Em 1851, esta doação foi reduzida devido à mudança de D. Amélia para o Funchal com sua filha doente D. Maria Amélia, que morreu após um ano e onde foi fundado pela sua mãe o Hospital Princesa Dona Maria Amélia, em sua honra. Isto fez com que esta ajuda fosse insuficiente e, em 1838, o asilo foi integrado no Ministério do Exército e o nome foi então alterado para Real Asilo de Inválidos Militares. Nos anos seguintes a 1854, foram feitas várias alterações no complexo, com o acrescento do portão de acesso ao asilo em ferro forjado, do pavimento que liga este portão ao próprio edifício, dos jardins que compõem a entrada do mesmo, a construção das cavalariças, do palheiro e também dos muros limitativos, que permitiu a deslocação da população entre aldeias, sem transpor os limites da propriedade. A 24 de agosto de 1869 foi constituída na lei o fundo estabelecido previamente por D. Afonso V (1837-1861) para o asilo, que visava cobrir os rendimentos necessários para o abrigo de militares e funcionários das forças armadas. No ano seguinte foi erigido o monumento em sua homenagem em frente à fachada do palácio-hospital. Em 1885 foram feitas algumas alterações, em especial na mata, por parte do então encarregado general José António Pereira de Eça (1818-1894). Ao se referir que foram feitas alterações na mata, está implícita uma preexistência, ou seja, que o parque já existia antes da referida data. A idade do cedro-do-Buçaco existente, pode assim ser um possível indicador da época de plantação da mata. Tal como este cedro, plantado no asilo em 1876, existe um cedro-do-Buçaco de estrutura muito semelhante, plantado em 1872, no Jardim França Borges (Príncipe Real) em Lisboa, que foi construído em homenagem ao herdeiro da rainha D. Maria II, D. Pedro V, o que pode indicar uma possível correlação entre ambos. Em 1959 o asilo foi integrado nos Serviços Sociais das Forças Armadas e em 1965 a sua designação foi alterada, passando a designar-se Lar de Veteranos Militares, até 1995, quando se volta a instalar uma nova mudança, ficando sob a tutela do Instituto de Ação Social das Forças Armadas e consequentemente do Ministério da Defesa, passando a designar-se, até hoje, Centro de Apoio Social de Runa.
O Asilo Militar de Runa destaca-se na paisagem envolvente pela sua imponência. Um portão de ferro dá acesso a uma grande avenida, que conduz ao edifício de estilo neoclássico. Do lado esquerdo deste acesso existe um parque de estacionamento e do lado direito a mata, da qual a avenida está separada por um muro. Ao chegar ao final desta rua com 170 metros de comprimento pontuada por laranjeiras, surge um largo ajardinado com os bustos da benemérita D. Maria Francisca Benedita do lado esquerdo e do rei D. Pedro V do lado direito, (sendo que anteriormente se encontrava no centro do eixo da avenida). Subindo as escadas encontra-se um átrio de acesso às instalações do asilo, onde se encontra a entrada para a igreja e duas estátuas em mármore de tamanho real, das imagens do Arcanjo S. Rafael, à esquerda, e de Santa Bárbara, à direita. A igreja possui uma estrutura em cruz e no seu centro um cruzeiro com dois altares, é forrada com diferentes mármores e tem quatro nichos com as imagens da Virgem Santíssima, S. José, S. Tiago e Santo António. No átrio, tem-se também acesso ao corredor no piso térreo e consequentemente aos dois pátios interiores, que têm ligação entre eles por uma pequena arcada que passa no centro do edifício. Cada pátio tem cerca de 80m2 e vários espécimes de laranjeiras (Citrus sinensis) e abacateiros (Persea americana). No interior do Palácio-Hospital existe um espólio artístico deixado pela princesa D. Maria Francisca Benedita. Por sua vez, no seu exterior foi preservado um enorme espólio natural, de diferentes espécies, tanto nos pomares em frente à fachada sul, como na sua mata. Esta é toda murada e possui um portão próprio de acesso, em que ao entrar nesta área se é confrontado com uma quantidade imensa de árvores de grande porte, uma área ajardinada e passeios acompanhados por buxo. Junto ao limite oeste é possível observar uma área gradeada com um pequeno lago para animais como patos, gansos e pavões. No seguimento deste local, com rumo a sul, é possível observar um lago de pequenas dimensões que pontua o caminho até ao grande cedro-do-Buçaco (Cupressus lusitanica) com cerca de 20 m de diâmetro apoiado sobre uma estrutura metálica. Este espécime foi classificado como árvore de interesse público em 1940. É possível percorrer toda a mata por caminhos interligados entre si, que se encontram no centro da mata numa clareira, onde são, por vezes, organizados arraiais para os atuais moradores do Hospital-Palácio de Runa, que continua a albergar os militares, suas famílias e trabalhadores das Forças Armadas.
Imóvel de Interesse Público / Decreto n.º 47 508, DG, I Série, n.º 20, de 24-01-1967 (edifício)
Árvore de Interesse Público
Cedro-do-Buçaco (Cupressus lusitanica Miller)
Nº Processo: KNJ1/025
Classificação: D.G. nº 92 II Série de 20/04/1940
Inventário: Filipa Santos e Sónia Talhé Azambuja (março de 2020)
Parque do asilo militar de Runa
(consultada em março de 2020)
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